A Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pelas mortes e violações de direitos humanos de 64 pessoas em uma explosão de fábrica clandestina em Santo Antônio de Jesus, na Bahia, em 11 de dezembro de 1998. A informação foi confirmada pela ONG Justiça Global, na segunda-feira, dia 26 de outubro de 2020.
Segundo a ONG, a decisão foi proferida no dia 15 de julho de 2020, durante o 135º Período Ordinário de Sessões, mas só foi tornada pública na segunda (26), após considerar o cenário do ocorrido.
“As vítimas se encontravam em situação de pobreza estrutural e eram, em amplíssima maioria, mulheres e meninas afrodescendentes, quatro delas estavam grávidas e não dispunham de nenhuma alternativa econômica senão aceitar um trabalho perigoso em condições de exploração”, disse parte do documento enviado ao G1 pela ONG.
O documento ainda pontua que a Corte considerou que o estado brasileiro tinha conhecimento de que eram realizadas atividades perigosas na fábrica e não inspecionava nem fiscalizava o local adequadamente. Disse ainda que o local “apresentava graves irregularidades e alto risco e perigo iminente para a vida, integridade pessoal e saúde de todos os trabalhadores. Além das irregularidades citadas, a fábrica era exploradora de trabalho infantil, o que violava os direitos ao trabalho e ao princípio da igualdade e não discriminação”.
A explosão ocorreu pouco depois das 11 horas do dia 11 de dezembro de 1998. Os homens ficavam em um local fabricando as bombas, enquanto as mulheres ficavam em uma área mais acima, amarrando os traques de pólvora. De acordo com as investigações da época, no momento da explosão, havia 1,5 tonelada de pólvora no local.
Ainda conforme a ONG, dos 64 trabalhadores mortos na explosão, 63 eram mulheres. A única vítima do sexo masculino era uma criança de 11 anos de idade. Dentre as vítimas havia 22 crianças e adolescentes, com idades entre 11 e 17 anos. A maioria era negra.
O documento explicou que dos 57 atestados de óbito juntados ao processo, 49 eram de pessoas negras, 3 brancas, e 6 sem identificação. Quatro mulheres grávidas e três bebês que ainda estavam no ventre foram vítimas da explosão.
Nos 20 anos da tragédia, parentes de vítimas e sobreviventes da explosão fizeram uma manifestação na cidade.
Justiça:
Em 1999, o Ministério Público da Bahia entrou com medida cautelar para bloquear os bens dos responsáveis pela fábrica clandestina. Em 2013, foi fechado um acordo para pagamento de indenizações às famílias das vítimas, contudo o acordo foi descumprido. Em 2016, um novo acordo foi feito, mas segundo a promotora Aline Coutrim, só foi pago parcialmente.
“A gente teve que executar esse acordo, então incidiu multa, cláusula penal, e o valor chegou a R$ 1,7 milhão. Depois que o MP entrou com a execução, foi feito um novo acordo do qual foram pagas algumas parcelas. Foram pagos três depósitos, foi levado um bem a leilão, e hoje a gente ainda tem R$ 476 mil de débito que precisa ser quitado aproximadamente”, disse a promotora em 2018.
Na esfera criminal, oito pessoas foram a júri popular, no Fórum Rui Barbosa, em Salvador, no ano de 2010: Oswaldo Bastos Prazeres, o dono da fazenda, quatro filhos dele e três funcionários.
Os funcionários foram absolvidos, enquanto Osvaldo e os filhos foram condenados à prisão em 2010, com penas que variaram entre 9 e 10 anos, por armazenar material explosivo de forma ilegal e produzir fogos de artifícios sem segurança.
Porém, até agora ninguém foi preso. Os réus recorreram da decisão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), que confirmaram a condenação, mas os réus ingressaram com outro recurso no STF. Os condenados alegam que teria havido descumprimento de direito à defesa.
Por G1 Bahia
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