O senador Telmário Mota (Pros-RR) mantém um ritual mensal desde quando assumiu o cargo, em 2019. Ele deposita R$ 18 mil a cada 30 dias para uma pessoa física, chamada Daura de Oliveira Paiva, pelo aluguel de uma caminhonete. Desde então, o valor do desembolso, com verba da cota parlamentar, já chegou a R$ 437 mil.
Com base nos dados do Portal da Transparência do Senado, é possível ver as quantias ressarcidas ao senador para pagar despesas com locomoção, hospedagem, alimentação e combustíveis. Nos quatro primeiros meses de 2021, o parlamentar já usou R$ 90.696,75 da cota parlamentar para esses gastos, R$ 72 mil apenas pelo aluguel do veículo. De acordo com as notas, os R$ 18 mil são para pagar o aluguel mensal de uma Mitsubishi Triton Sport GLX, modelo 2019. Na tabela Fipe, principal referência no mercado de carros usados e seminovos, o veículo está avaliado em R$ 128.723,00. Isso significa que, com o montante embolsado por Daura até agora, seria possível comprar ao menos três caminhonetes.
A cota parlamentar não pode ser usada para compra de patrimônio, mas a comparação com o valor do bem alugado por tanto tempo faz surgir dúvidas sobre a racionalidade do uso da verba pública. Mesmo na opção aluguel, entretanto, a quantia gasta mensalmente pelo senador chama a atenção pela discrepância em relação a valores facilmente constatados em uma consulta rápida a empresas formais, especializadas em aluguel de veículos. Em uma busca no site de locação de veículos Localiza, na franquia de Boa Vista (RR), é possível alugar, mensalmente, caminhonetes do mesmo grupo da usada pelo senador. Os preços diários variam, mas o plano mais caro é de R$ 302,23 por dia, e com proteção básica ao carro, contra coisas como roubo, furto e pequenos acidentes. Ao fim do mês, isso significa um gasto, a cada 30 dias, de R$ 9.369. Ou seja, metade do valor desembolsado por Telmário com dinheiro público.
O site Metrópoles também conversou com o proprietário de uma franquia da Mitsubishi, que não quis ser identificado. Ele afirmou que o valor do aluguel pago pelo parlamentar está acima da média.
Outra simulação fácil de ser feita por meio da internet é a de leasing, uma espécie de contrato de aluguel do carro por um período estabelecido, porém na qual o banco oferece a opção de compra do veículo ao fim da assinatura, nos valores da tabela Fipe. Nesse modelo, é possível arrendar um carro de R$ 130 mil por R$ 3.995,52 mensais, em 36 meses. Contudo, há uma entrada de 20% do valor (R$ 26 mil, algo como uma mensalidade e meia da paga atualmente pelo senador). No fim desses três anos, a caminhonete poderia ser adquirida por R$ 169.838,72, já pagos nesse período.
O carro locado por Telmário fica em Boa Vista, capital de Roraima, para uso do senador quando ele não está em Brasília para as sessões do Senado, normalmente, em sábados e domingos, além de dias eventuais no início e no fim de cada semana. Quando estão em Brasília, os senadores têm carro oficial, com motorista, à disposição para transitar por onde quiserem.
A reportagem não conseguiu contato com a locadora do carro. O Metrópoles procurou a assessoria do parlamentar, em busca de uma posição do senador sobre as opções pelo aluguel e pelo contrato com uma pessoa física, não com uma empresa de locação formal. O gabinete de Telmário não respondeu. O espaço permanece aberto, tanto a Daura de Oliveira Paiva quanto ao senador.
⇒“Desvio de finalidade”:
O advogado Thiago Sorrentino, especialista em direito do Estado e tributário, afirma que, sem um devido processo de apuração, não é possível cravar que haja algum ilícito na atitude de Telmário Mota. Ele cita o que é considerado ilícito em casos envolvendo patrimônio e recursos públicos.
“Incluem-se como atos ilícitos contra o patrimônio público o desvio de finalidade, a inexistência de motivos e a ilegalidade do objeto. A circunstância de haver pagamentos recorrentes de valor incompatível com o aluguel do objeto pode sim, em tese, caracterizar esse ilícito”, declara Sorrentino.
O advogado explica que já três órgãos e pessoas competentes para pedir a abertura dessa apuração:
“O próprio Senado, via controle interno, o Tribunal de Contas da União (TCU), via controle externo, mas, mais importante, qualquer cidadão poderia ajuizar uma ação popular”, pontuou.
Por Thayná Schuquel – Metrópoles.
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