Em uma carta divulgada nesta terça-feira, dia 11 de agosto de 2020, o delegado da Polícia Civil no Distrito Federal, Ricardo Viana, revelou ter se encontrado com familiares do homem que o chamou de “macaco” na semana passada, em um comércio do Lago Sul. Segundo contou, os parentes do ofensor (Pedro Henrique Martins Mendes) pediram desculpas pelo ataque.
“Hoje, recebi o irmão e o pai da pessoa que ofendeu a mim e a minha filha na última sexta-feira (7/8). Condicionei esta conversa a nada pedirem em relação ao processo que há de vir. Ambos se retrataram em nome do ofensor”, afirmou o policial.
“Neste momento, creio que não há espaço para se alimentar o ódio. Conversamos de forma polida, assim como três pessoas diferentes e tolerantes devem se ater”, destacou.
Em outro trecho, o policial se lembrou da sua origem e, independentemente do cargo que ocupa, da necessidade de exigir uma sociedade igualitária.
“Não nasci delegado, mas sim, negro, caçula de oito irmãos, filho de uma Raimunda e de um Antônio, ambos nordestinos, os quais migraram para esta cidade em busca de melhores condições de vida. Aqui nasci e pretendo viver como cidadão, isto é, em igualdade com os demais que aqui habitam”, escreveu.
O delegado citou nominalmente vítimas de ataques racistas pelo país neste ano, entre elas o motoboy Matheus, destacando que muitas delas sofrem ainda no anonimato o preconceito gerado pelo tom da pele.
“De onde vem tanto ódio?”, questionou.
“Sem dúvida, este debate encontra-se aberto há 131 anos, momento em que meus antepassados, escravos, ou melhor, escravizados, foram ‘libertados’ e até hoje, nós, negros, lutamos por direitos básicos”, ponderou.
“Creio que chegou a hora não de incrementar, mas de incendiar este tema, para que possamos, um dia, termos uma sociedade mais justa e igualitária”, assinalou Viana.
E concluiu o texto: “À minha filha, meus sinceros sentimentos de lhe ter exposto o mundo preconceituoso de forma tão truculenta. Aos racistas, o meu silêncio. Respeito!”
Durante a sessão virtual da Câmara Legislativa da tarde desta terça (11), o deputado Chico Vigilante leu o texto escrito por Ricardo Viana. O petista e o deputado Fábio Felix (PSol) fizeram o alerta para o número crescente de casos de racismo em Brasília neste ano.
Leia a carta na integra:
“Hoje, recebi o irmão e o pai da pessoa que ofendeu a mim e a minha filha na última sexta-feira. Condicionei esta conversa a nada pedirem em relação ao processo que há de vir. Ambos se retrataram em nome do ofensor. Neste momento, creio que não há espaço para se alimentar o ódio. Conversamos de forma polida, assim como três pessoas diferentes e tolerantes devem se ater. Não sei o porquê de Deus me colocar naquele cenário com uma pessoa que jamais vi e acontecer o que todos já sabem, mas a minha voz ecoou muito além do que eu imaginava. Talvez por ocupar um cargo em uma das melhores polícias judiciárias do país. Sim, talvez. Uma coisa é certa, não nasci delegado, mas sim, negro, caçula de oito irmãos, filho de uma Raimunda e de um Antônio, ambos nordestinos, os quais migraram para esta cidade em busca de melhores condições de vida. Aqui nasci e pretendo viver como cidadão, isto é, em igualdade com os demais que aqui habitam. Passamos uma semana com incidentes incomuns, Matheus, Ricardo, Francisco e muitos outros que estão anonimato foram subjugados, simplesmente pelo tom da pele. De onde vem tanto ódio? Sem dúvida, este debate encontra-se aberto há 131 anos, momento em que meus antepassados, escravos, ou melhor, escravizados, foram “libertados” e até hoje, nós, negros, lutamos por direitos básicos. Creio que chegou a hora não de incrementar, mas de incendiar este tema, para que possamos um dia termos uma sociedade mais justa e igualitária. À minha filha, meus sinceros sentimentos de lhe ter exposto o mundo preconceituoso de forma tão truculenta. Aos racistas, o meu silêncio. Respeito!”
Por Francisco Dutra – Metrópoles
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