Esta segunda-feira será o dia do cão na economia mundial. Os mercados estão derretendo, 10 mil eventos de negócio cancelados, comércio mundial afundando e a crise atingindo mercados futuros, companhias de navegação e aviação.
Para completar, o rompimento do acordo de preços da OPEP + terá impactos profundos, que afetarão o mercado brasileiro logo na abertura das bolsas.
Abaixo, um roteiro para entender o tamanho da crise do petróleo.
A lógica do rompimento do acordo da OPEP:
A última guerra de preços do petróleo foi em 2014, penalizando os produtores do Mar do Norte e Dakota do Norte, com um custo maior de extração.
A OPEP + (o acordo envolvendo OPEP e outros grandes produtores) foi implementado pela primeira vez em dezembro de 2017, quando as cotações do petróleo Brent caíram para US$ 40,00. O acordo, visando limitar as exportações, segurou as cotações do Brent acima de US$ 60 por barril e, em alguns momentos, acima de US$ 70.
Na quinta-feira, dia 05, países da OPEP propuseram cortes adicionais nas exportações, para impedir a queda provocada pela redução da atividade econômica mundial com o coronavírus. A Rússia não estava presente na reunião. Na 6a, seus representantes recusaram a proposta do corte adicional, provocando uma queda de 10% nos preços do petróleo, o pior dia em mais de cinco anos.
Havia uma lógica da reação da Rússia. O acordo em vigor reduziu a oferta de petróleo da OPEP + e melhorou as cotações do petróleo Brent. Mas o espaço aberto pela queda da produção foi ocupada pelo óleo de xisto americano.
Principal aliada dos Estados Unidos, o troco veio da Arábia Saudita. Na 5a feira, ela havia proposto reduzir a produção para 9 milhões de barris dia. Com a decisão da Rússia, de sair do acordo, no dia seguinte anunciou o aumento de sua produção podendo chegar a 12 milhões, com oferta agressiva de desconto às refinarias.
O anúncio derrubou os preços do petróleo Brent para US$ 45 o barril. A lógica apresenta foi simples. Se a decisão da Rússia implicaria em queda nas cotações, a maneira da Arábia Saudita compensar a queda de receita seria aumentar a produção – o que acentuaria a queda nas cotações.
Ontem, o Goldman Sachs reduziu sua previsão de preço para o Brent para US $ 30 o barril no segundo e terceiro trimestres, e alertou que pode haver queda para US $ 20 o barril nas próximas semanas. Seria o caos.
O novo desenho mundial do petróleo:
Após os ataques de drones e mísseis, a Arábia Saudita conseguiu restaurar sua capacidade de produção de 12 milhões de bpd.
Segundo os especialistas, ela deverá mirar especialmente o mercado do noroeste da Europa, hoje atendido pelo petróleo russo. Esperam-se descontos de até US$ 8 por barril, em relação a março.
De fato, depois do seu IPO, a Aramco, a estatal de petróleo saudita, cortou em US$ 4 a 6 o preço do barril para a Ásia e em US$ 7 para os EUA. Para as refinarias do noroeste da Europa o desconto foi de US$ 8 a US$ 10,25 por barril, contra um desconto de US$ 2 oferecido atualmente pela Rússia.
Não será apenas a Rússia a ser pressionada, mas também os aliados da Arábia Saudita no Golfo, como Emirados Árabes Unidos e Kuwait. Eles serão obrigado a reduzir os preços e, para preservar a receita, aumentar a produção.
Traders e analistas estimam que, se não houver a recomposição dos tratados, as cotações de petróleo poderão cair para US$ 30 ou menos, voltando à guerra de preços de 2014.
Há quem aposte em petróleo abaixo de US$ 20 por barril. Em dezembro de 1998, quando a Arábia Saudita armou uma das guerras de preços, as cotações caíram para US$ 9,55 o barril. Os maiores atingidos serão as economias fracas e mais dependentes de petróleo, como Nigéria e Angola. Mas haverá problemas reais de inadimplência nos mercados futuros de petróleo.
A lógica capenga saudita:
Há quem veja na posição da Arábia Saudita a estratégia de levar a situação a um ponto crítico para chamar os produtores novamente à mesa de negociação, com novas metas de corte na produção.
Em 2014 e 2015 ela tentou implementar esse tipo de estratégia e falhou, porque a Rússia demonstrou ter mais condições do que ela de absorver os preços baixos.
O mesmo acontece agora. Para enfrentar a guerra de preços no curto prazo, a Rússia constituiu um fundo de US$ 170 bilhões com as receitas excedentes de petróleo dos últimos anos.
No caso da Arábia Saudita, se o preço médio fosse mantido em US$ 58, ainda assim haveria um déficit projetado de 6,4% do PIB. Com o petróleo caindo abaixo de US$ 40 o bpd, haveria um desastre orçamentário, com reflexos políticos graves.
O futuro do xisto:
Os níveis atuais do petróleo ajudaram a segurar a indústria do xisto americana, que se sustenta em três pernas, de acordo com o diagnóstico da Bloomberg Energia.
- A capacidade de exportar legalmente petróleo bruto para outros países;
- Uma licença contínua para construir oleodutos e realizar operações de faturamento, atropelando as cautelas ambientais; e
- A continuação do acordo da OPEP + que limita as exportações de outros países produtores de petróleo.
A questão ambiental tornou-se ponto vulnerável nessa construção delicada. Mas o ponto central, de viabilização do negócio, eram os acordos de preços da OPEP + (que reúne países da OPEP e outros grandes produtores como a Rússia).
As consequência sobre o Brasil:
Nos doze meses acumulados até fevereiro de 2020, o Brasil exportou US$ 24,5 bilhões em derivados de petróleo e importou US$ 9,1 bilhão, resultando em um saldo de US$ 15 bilhões.
Uma queda de 20% nas cotações, se incidindo uniformemente sobre todos os produtos, resultaria em uma perda de US$ 3 bilhões no saldo comercial.
A coronavírus esta impactando os preços dos commodities como um todo. Até fevereiro, o Brasil acumulou um saldo comercial de US$ 102 bilhões em produtos básicos, e um saldo total de US$ 44,7 bilhões. Uma queda de 20%, portanto, significaria redução de mais US$ 20 bilhões no superávit comercial.
Por Luís Nassif – GGN (O JORNAL DE TODOS OS BRASIS)
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