RJ terá testes da vacina de Oxford contra a Covid-19 inicialmente com mil voluntários

Os testes da vacina da Universidade de Oxford contra a Covid-19 terão inicialmente mil doses aplicadas em voluntários no Rio de Janeiro, em ações feitas pela Rede D’Or São Luiz e pelo Instituto D’Or (IDOR).

Ao instituto, caberá participar da seleção, aplicação, registro e análises dos dados coletados, em estreita colaboração com a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), que coordena o estudo com a vacina no Brasil. Mil voluntários também serão vacinados nesta primeira fase, em SP, e a Fundação Lemann financia a estrutura médica e os equipamentos da operação.

No Rio, os custos, em torno de R$ 5 milhões, serão cobertos pela Rede D’Or, e todo o trabalho será coordenado pelo IDOR.

Nas outras fases, o grupo vai acompanhar voluntários em diferentes locais do Brasil e viabilizar a aplicação de mais 5 mil doses da vacina.

A vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford já está sendo testada em dez mil pessoas por lá. O Brasil é o primeiro país fora do Reino Unido a participar dos testes. Até o fim, serão 50 mil voluntários vão ser vacinados no mundo.

Os voluntários precisam ser soronegativo. Ou seja, não podem ter contraído a Covid-19 anteriormente. Também precisam estar na linha de frente do combate à Covid-19, uma vez que estão mais expostos à contaminação.

Dilema da prova de eficácia:

Em entrevista exclusiva na quinta-feira (28), a cientista brasileira Daniela Ferreira, que participa do projeto, já tinha adiantado ao G1 o dilema da prova de eficácia:


“Os responsáveis pela pesquisa em Oxford viam com preocupação o impacto da diminuição da curva de casos no Reino Unido na pesquisa.”


Já naquela época o grupo se organizava para ampliar os testes em uma região com altas taxas de circulação do Sars-Cov-2 para poder acelerar a comprovação da possível eficácia da vacina.


“É uma situação um pouco bizarra, porque você quer que o coronavírus desapareça, não quer que as infecções continuem”, diz a chefe do departamento de ciências clínicas da Escola de Medicina Tropical de Liverpool.


Para provar mais rapidamente se a fórmula é eficaz, é preciso que os voluntários tenham contato com o vírus e, atualmente, o Brasil é considerado o epicentro da pandemia.


“Um dos fatores limitantes de tudo isso é se a gente vai continuar a ter, nos países em que as vacinas estão sendo testadas, um número de infecção que permite que você teste essa vacina rapidamente”, explicou Daniela Ferreira.


Aprovado pela ANVISA:

Para ser conduzido no Brasil, o procedimento foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), com o apoio do Ministério da Saúde. Os voluntários serão pessoas na linha de frente do combate ao coronavírus, com uma chance maior de exposição ao Sars-CoV-2. Eles também não podem ter sido infectados em outra ocasião. Os resultados serão importantes para conhecer a segurança da vacina.

Testes já começaram no Reino Unido:

Com a previsão otimista de ficar pronta ainda em 2020, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford ofereceu proteção em um estudo pequeno com seis macacos, resultado que levou ao início de testes em humanos no final de abril.

Em humanos, os testes têm apenas 50% de chance de sucesso. Adrian Hill, diretor do Jenner Institute de Oxford, que se associou à farmacêutica AstraZeneca para desenvolver a vacina, disse que os resultados da fase atual, envolvendo milhares de voluntários, podem não garantir que a imunização seja eficaz e pede cautela.

A vacina já está sendo aplicada em 10 mil voluntários no Reino Unido. A dificuldade para provar a possível eficácia está no fato de os cientistas dependerem da continuidade da circulação do vírus entre a população para que os voluntários sejam expostos ao coronavírus Sars-Cov-2.

Outras vacinas em andamento:

Relatório publicado no site da Organização Mundial de Saúde (OMS) com dados até a terça-feira, dia 02 de maio de 2020, mostra que estão em desenvolvimento pelo menos 133 candidatas a vacina, sendo que dez delas estão na fase clínica, ou seja, sendo testadas em humanos.

Embora os estudos avancem em todo o planeta, muitos especialistas acreditam que a vacina não estará disponível em 2020. Projeções otimistas falam num prazo de 12 a 18 meses, que já seria recorde. A vacina mais rápida já criada, a da caxumba, levou pelo menos quatro anos para ficar pronta.

Outra hipótese contra a qual todos os pesquisadores lutam é a de que uma vacina efetiva e segura nunca seja encontrada. O vírus do HIV, que causa a Aids, é conhecido há cerca de 30 anos, mas suas constantes mutações nunca permitiram uma vacina.


“Está todo mundo muito otimista, mas estudo de vacina é algo muito complicado. A maioria deles para na fase 3, de testes clínicos, pelos problemas que aparecem. É importante discutir essa possibilidade de não se ter uma vacina”, admite Álvaro Furtado Costa, médico infectologista do HC-FMUSP.


Gustavo Cabral, imunologista que lidera um estudo na USP e no Incor concorda:


“A vacina é o melhor caminho profilático [preventivo], mas não é o único caminho, há também os tratamentos. Para o HIV não há vacina e as pessoas que têm o vírus podem ter uma vida normal. Sabemos que aproximadamente 80% das pessoas infectadas com o Sars-CoV-2 não desenvolvem a Covid-19 ou têm sintomas leves. O problema são os outros 20% e o risco de fatalidade, hoje de 6%. Mas há centenas de estudos sobre medicamentos neste momento”, disse.


A busca pela vacina:

Para chegar a uma vacina efetiva, os pesquisadores precisam percorrer diversas etapas para testar segurança e resposta imune. Primeiro há uma fase exploratória, com pesquisa e identificação de moléculas promissoras (antígenos). O segundo momento é de fase pré-clínica, em que ocorre a validação da vacina em organismos vivos, usando animais (ratos, por exemplo). Só então é chegada à fase clínica, em humanos, em três fases de testes:

  • Fase 1:avaliação preliminar com poucos voluntários adultos monitorados de perto;
  • Fase 2: testes em centenas de participantes que indicam informações sobre doses e horários que serão usados na fase 3. Pacientes são escolhidos de forma randomizada (aleatória) e são bem controlados;
  • Fase 3: ensaio em larga escala (com milhares de indivíduos) que precisa fornecer uma avaliação definitiva da eficácia/segurança e prever eventos adversos; só então há um registro sanitário.

Depois disso, as agências reguladoras precisam aprovar o produto, liberar a produção e distribuição. Das dez vacinas em testes em fase clínica, algumas aparecem em estágio mais avançado, como a desenvolvida por Oxford, em fase 3.

A vacina do Reino Unido é produzida a partir de um vírus (ChAdOx1), que é uma versão enfraquecida de um adenovírus que causa resfriado em chimpanzés. A esse imunizante foi adicionado material genético usado para produzir a proteína Spike do SARS-Cov-2 (que ele usa para invadir as células), induzindo a criação de anticorpos.

A empresa AstraZeneca já fechou com EUA e Reino Unido para cuidar da produção em escala mundial. O CEO da farmacêutica disse à rede britânica BBC, neste domingo (31), que a população pode ter acesso a 100 milhões de doses da vacina já em setembro.


“De forma prática: é possível que uma vacina fique disponível em cerca de 18 meses por causa do investimento no mundo inteiro. O mundo parou. Mas eu diria que é impossível até setembro”, opina o brasileiro Gustavo Cabral.


Álvaro Furtado Costa também recomenda cautela com anúncios muito otimistas sobre vacinas. Ele acredita que não se pode desprezar, por exemplo, que uma novidade nesse campo impulsiona as ações da empresa que a anuncia.


“Quando se começa um estudo de vacina, a fase 1 tem resultados bem preliminares e rápidos, para começar a avaliar se é segura, se não tem grandes efeitos adversos, mas você testa pouca gente. Nas fases 2 e 3, você testa 10 mil, 20 mil pessoas, isso é mais demorado. Aí, você vê se realmente protege. O mundo testou vacinas de HIV que chegaram à fase 3, e ,aí, falharam. É preciso ter calma”, disse Costa.


Testes de vacina contra a Covid-19 no RJ começam com mil voluntários — Foto: Reprodução
Foto: Reprodução

Fonte: G1 Rio

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